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A escrita sempre foi fiel. Os episódios aqui encontrados são batizados de Escarros pois os mesmos são expurgos íntimos e partos divinos diferencialmente temperados pelos versos e circunstâncias que os compõem. Muitas vezes escorrem coisas a todo o tempo sem controle, disso tiro a lição e arte que se eterniza, mesmo que a poucos olhos. O valor é da existência. -Se fosse objeto seria polaroid, cuspiria poesia.

segunda-feira, 23 de abril de 2018

DEVANEIO DE OLGA: CARTA PARA TI







Eu sei que estás aí e se ainda não, vais vir. 

É de vocativos que anunciam as noites escuras e tortuosas da cidade pequena. Tua cidade não sacia ainda a tua vontade. Sei, mulher. A curiosidade aguça o risco da possibilidade, permita-me te olhar. Deixa-me observar e chega em mim a fim de chegar. Eu preciso te mostrar algo pois temo que tua sapiência para as coisas vãs te levem a resultados impostores. Resvalo o ódio pelos esgotos das ruas e ajudo o homem a trilhar o seu caminho, não me incluo no caminho, sou ele todo e meu. Percebe? A soberba já massacrou o meu ímpeto. Deixe que eu me explique. Tento não me repetir e sinto que estou a curtir desse episódio delongas demais, faço propositalmente para que esmiúce todo o resto. Todos que aqui estão são descuidados, vê? Os advérbios rondam teu corpo e tua aura. Não sou ninguém, nunca hei de ser. É que aprendi o sentido de dar a outra face. Quando, antes de ti, eu sabia de tudo o que seria capaz, rio, eu sou capaz de alcançar graças insones. Tua veste contemporânea e tua voz pouco rouca e baixa ainda estão passando pelo portão. Sei, estás de saída mas escuta e deixo que nunca mais me veja.  Dia desses na cadeira de balanço lembrei da vida antes de ti, o fractal estava em posição constante. O domínio te aflige? Não há mal nenhum em ter cautela, ouvi de um homem que tinha tristeza nos olhos e mãos firmes. Tua vivacidade não está resumida aos impulsos noturnos, muito mais que a riqueza dos dias novos, está o culto ao eterno.Os sortilégios alcançam aqueles que se lançam, importar-se com o outro é edificante, pequena.  De súbito morre o corpo e, para mim, já basta. Quero, pequena criatura, não ditar o que fazes de teus planos. Aprendi a achar o controle de meus passamentos quando desejo aniquilar o egoísmo humano. E continuo rindo quando devaneio em tal presunção. O que, na tua inocência sobre-humana, te fez pensar que eras maior que o que já habitava no mundo? Sei bem, és encantada pelo desconhecido, deslumbrada e insana. Nada é tão digno de perdão que tamanha ingenuidade. Talvez tu te demores muito a receber esta mensagem, talvez em minhas projeções astrais eu já tenha conseguido te dizer o que pareceu não carregar consigo: Protege o coração de outra mulher como tu proteges o teu.  A deusa continua visitando os meus sonhos e desconfio que seja um crime não reproduzir seus recados. Não serei injusto e pesar teus ombros. Céu não se ganha, não estou atrás de céu.  É que é bom andar à noite e ter liberdade cármica. Apelo para que tua passagem seja erguida sobre os pilares da consciência. Que é ser um homem? Que é ser uma mulher? Que é um Ser? Desromantizo as possibilidades. Corto as arestas da verdade e adapto-me. Aprendi com tua demolição casual que o mais sábio adapta-se e consegue sobreviver ao caos. Sigo latente de olhos fixos e te vejo, te vejo e sinto tua aura. Me parece agitada. O que te tornou alheia, baby? O que doeu não foi tua vontade de ir embora. Pra quê sair ás escondidas? Por  que usar da artimanha da ausência minha no teu projeto de felicidade?  Pensei que os ares da cidade grande te tornariam diplomática. Presumi errado, como quase tudo de ti. Dia desses me distraí e ao andar de cara para os vitrais quase não me reconheci. Ria muito de saber que um dia projetei em ti uma espécie de mim. Permita-me o benefício da dúvida. Certamente o que se alojou não foi o ego. Cada um de nós é um universo e Inácio falava com maestria sobre a culpa e a índole. Eu desejava não sentir culpa. Eu guerreava em abstinências de ti. Eu guerreava com os julgamentos e te defendia. Havia uma guerra no mesmo corpo. A mesma causa. Eu não posso te julgar e tampouco te defender. Que sou eu?  Perambulo entre as calçadas e vejo um homem, um homem igual a mim tecendo as tardes como eu faço, um homem observando os lábios finos e os voluptuosos. Antes de ir, saiba que o real é bonito. A realidade agora é observada por mim sob outra perspectiva. Não fosse tu... deu-me o presente da catarse. Sei que está cansada, o meu processo é deveras arrastado. Nada tenho a perdoar. Caminho com muito mais cuidado depois que teus olhos me lançaram facas certeiras de tão longe. Tens a mira boa, assumo. Não estás sozinha. O mundo ainda não é teu. Existem outros caminhos e de nada adianta trilhar um caminho deixando um corpo apodrecendo na estrada. Não há gozo na deslealdade mesmo que para com um transeunte que nada represente a ti. O poder dos homens revela a sua incapacidade de afetos com os desconhecidos. Vive-se na conveniência, bebe-se a aparência. A configuração exterior distrai os aflitos. Tenha para ti um espasmo que te dou de graça: O segredo está na direção em que a perna cruza, poupa-lhe o tempo e lança-te noutras águas. Nem de longe te falo aqui o que realmente quero; Estão a nos espionar. Me despeço sem ter querido pisar em teu coração. Sei que dói. Já fui mulher, eu sei.