Quem sou eu

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A escrita sempre foi fiel. Os episódios aqui encontrados são batizados de Escarros pois os mesmos são expurgos íntimos e partos divinos diferencialmente temperados pelos versos e circunstâncias que os compõem. Muitas vezes escorrem coisas a todo o tempo sem controle, disso tiro a lição e arte que se eterniza, mesmo que a poucos olhos. O valor é da existência. -Se fosse objeto seria polaroid, cuspiria poesia.

domingo, 20 de dezembro de 2015

RECADO

Chore até as cinco da manhã se for preciso
Acenda um cigarro no terraço de casa
As nuvens vão passar na lua
Vai ser a última vez, eu prometo
Você vai entender que bem querer é maior que tudo
E vai  chutar a dor do apego lá de cima do muro
Não procure entender as razões
As coisas nem sempre tem sentido e o que tem ainda é absurdo
Conte até três se soluçar
Não vai doer mais, jájá vai sarar
Deite na cama e feche os olhos
Você vai entender todas as músicas e todos os clichês
E vai saber que esse recado tinha que ser dado dessa forma pra você
Não jogue ira pro destino
Aceitar e enxergar é o melhor caminho
Conte até dez, lave os olhos e respire fundo
Todo o véu arrancado é pra te mostrar o melhor do mundo.

sábado, 19 de dezembro de 2015

Conversa de calçada norte-sul

-Gosto de seus três corações verdes.
Disse Tassiano fazendo um barulho estranho com a boca pra fumaça durar
Sentando numa das praças de Porto Alegre, contemplando os espaços entre as folhas e o céu
-Há quem pise nos três.
Disse Olga com a boca amarga da noite passada, deitada em posição de quem pede abrigo.
O cheiro dos dedos ainda a atormentam mas sua reza é forte.
-Ontem eu ia fazendo uma loucura.
-Ainda bem que não fez. E o que fez pra não fazer?
-Nada. Há muito tempo eu não fazia isso:nada.
-Ás vezes é o melhor a se fazer...


CATARSE TORÁCICA

Deve haver algum lugar entre o que foi dito e o que foi feito que um dia eu vá visitar, mas não quero.
Com certeza tem um lugar lá pras bandas de bom jesus em que eu vá entender a tolice alheia em proliferar  e ramificar todos os olhares às seis da manhã pra morrer seis da tarde. Há de haver um louco pássaro que sussurre no meu ouvido uma só palavra que tire o peso da interrogação das minhas costas. Há de ter uma razão pra todas as filosofias vãs que eu acreditei existirem por ter montado o seu próprio personagem de par ideal com a sua ajuda e todo um material divino e fui tão livre que a peça toda era minha, inclusive o drama. Há de ter um lenço no meio do caminho ou um jornal dobrado com alguma mensagem subliminar, uma ligação no fim do expediente que me faça entender o quão humanos somos. Há de ter um dia em que os corações parem de se emaranhar e transformar o fígado num eterno pardieiro e calabouço de tudo que não existiu. Há de ter um sol diferente quando eu passar na frente daquele viaduto outra vez. Há de ter pra onde eu olhar quando não quiser sentir vertigem, mesmo que não seja pros teus cabelos quando atravessava o sinal pra ir comprar cigarros. Há de ter um lençol que eu não precise lavar com ilusão de que todos os cheiros saíram dos dedos, porque sempre vem outros cheiros e a merda toda sempre esteve na frente do ventilador e eu tirei pra não te sujar. Há de ter um travesseiro castanho, e amanhã um ruivo pra cada coração verde que é colhido, Há de ter paz entre as lacunas que ficaram tão vazias quanto meu ventre, que meu coração cheio foi roubado e jogado por aí. Há de ter um dia uma luz no coração que foi embora com a facilidade de ir embora de um metrô lotado. Há de ter um dia em que um livro me baste e o manicômio e os cigarros sejam tão patéticos quanto a bandeja que eu entreguei na manhã do dia cinco . Há de ter mais cem dias pra que meu nome morra de vez, que se não for pra não ser falado porque eu respondia pelo apelido que tu botaste  não será também falado, igualmente espalhado como os delas por aí. Há de ter um novo apelido e um novo chaveiro pra mim também, um dia... que estou farta só de pensar e acho que a solidão nestes dias me apetece tanto quanto teu video game depois do expediente. Há de ter amor livre pra te receber nos olhos com nome de outra pedra  pros quatro cantos e o jogo de cintura que eu não tive por anos, que não sou desprendida e faço questão de nunca ser. Há de ter uma clareza que me faça entender porque você foi tão conivente quanto a menina do filme. Há de ter mais de cinquenta receitas e escutar aquela música do Belchior já está se transformando em outra coisa que não machuca. Há de ter uma luz que nunca se apaga. Há de ter.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

QUEDA

Desci no ponto do destino chamado
E fui até onde os pés sumiram num rastro ligeiro da madrugada
Meu coração pousou na janela
Ninguém voltou
Enquanto embalo e canto
Sonhos invadem meu quarto
Noite passada dormimos na beira da estrada
protegido pelos próprios olhos e luz
De manhã, deserto e silêncio
Alguma força me ensurdeça
Que meus ouvidos não distinguem bem
Quando os passos vão se distanciando  na estrada.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

Pode falar

Que na sua sopa eu  nem fui mosca
e de manhã meu ronco era insuportável
Que eu bebia demais e você é tão correto
E eu ali deitada imaginando você me contemplar
Enquanto no seu celular uma nova ligação de meia hora
Que eu sou louca e todo mundo já sabe
Já tá todo mundo cansado de saber
Que as visões sobre o mundo e suas lisergias eram divergentes
Mas só depois dos cem dias
Que essa poesia é coisa de mulher rejeitada
Tudo muda da noite pro dia
Das 4 da manhã pras 7, a fim de precisão
faltou dizer que eu não chorei pelos cantos
e isso é ofensa ao teu ego
Faltou você ser tudo o que pregava
Mas as pessoas não são o que elas fazem
E eu devo ter sido  mais um projeto
As pernas nunca foram azuis, era só a tv
tocando a mesma música do mês seguinte com outras pernas
Enquanto vi mar, mato e estrada
Você por aqui no seu ciclo vicioso, montando uma nova escala.

CONFESSIONÁRIO

Vejo a lama caindo  por dentro do jardim de inverno
e não consigo ignorar o abstrato
De onde você tirou pra jogar aqui?
Quantos corpos dentro dos azulejos você já enterrou?
É um grito de socorro?
Vida de orvalho que fica doce amanhã
Não espere pra se ancorar no cais de luz
Os ponteiros param de trabalhar quando bem entender
Todas as respostas pairam na pele do cordeiro que não dorme
Qual dobra arrebentou tuas raízes?
Mas tudo bem, você tem sempre uma mão na testa
E nos olhos tantos dedos
Criatura negra, mistério dos céus
O que você faz aí do lado da mesa colorida calado?
A vida é uma sala com uma mesa quebrada no canto
Esperando os dentes restantes caírem

domingo, 6 de dezembro de 2015

PARTO

A casa era nossa
Passei os pratos a limpo
Juntei todas as cinzas do caos passado
pela pureza que nasceu
Quando meu corpo se unificou aquelas paredes
entendi a que vim
E meus pés já tinham decorado  o caminho sem nenhum sacrifício
Era do jeito que fosse
Eu tinha atingido o ápice celestial do sentido da vida
O conjunto do ser era meu equilíbrio e o mundo continuava caindo
Mas éramos sobreviventes, éramos juntos e resistentes
Éramos mergulho em meio a toda aquela superfície de lodo
Convictos de que havíamos nos encontrado no meio do caminho
o encontro dos mortais de auras ímãs foi interrompido nessa vida?
Ele já respirava antes de mim e quando vim ao mundo ele já estava pronto
O que senti era inédito,  mas unilateral
Fomos passear no desconhecido de mãos dadas como sempre
Como no segundo dia em que nossos corações se beijaram e eu respondi :sim.
Saltei de paraquedas e esqueci da cordinha.
O que eu mais temia aconteceu...
De longe parecia bosque mas era manguezal e ele foi por lá, curioso.
-Eu te chamei pra ir pras dunas, que você faz aí?
-Quero ficar.
Meti os pés e as mãos e o corpo todo e não tive forças pra tirar o corpo dele  dali
Pois quando existe vontade a força dobra e ele infelizmente foi mais forte do que eu
Voltei pra casa e dormi
Avulsa
Ouvi no sonho que as gotas de orvalho ficam doce amanhã
Escutei sua voz de longe e ele não pedia ajuda, gritava coisas sem sentido.
Fincava as pernas na distância sem saber que eu estava reaprendendo a engatinhar
Quando dávamos as mãos havia a transmissão da força, a minha força quis partir.
A fraqueza bateu, tive que reaprender tudo.
O cheiro do meu cabelo misturado ao seu pescoço às duas da manhã do lado esquerdo da cama  ainda está impregnado nas paredes
Eu não vi quando derrubaram o vaso da nossa mobília
Nem sei quem foi
A povoação era enorme, sombras e sombras e vultos do inferno
Agora eu tinha que arrumar a nossa gaveta
Seu calção azul e seu isqueiro verde junto a  minha calça colorida da sua viagem
e os seus olhos lá fora que essa lembrança não dá pra guardar.
Você tem noção do  que eram o movimento daquelas pupilas dentro do meu coração?
Tive que jogar o âmbar do fim de tarde que seria até o fim do mundo
vencendo a vida donde ela viesse lá no sol
Antes eu tinha olhos de obsidiana, uma vez não tive rosto, hoje nada.
Soterrada pelas coisas que planejávamos
Como amordaçar a euforia de ter descoberto a felicidade?
Não sei esconder cadáveres
Bastava um sopro e o barco continuaria navegando
Juntos encontraríamos o cais
A mãe natureza não avisa a tempestade e eu não sabia nadar
Todas as coisas agora no fundo do mar, além de mim.
Perdi o meu  cúmplice de olhar espelhado sobre o mundo
Tivemos um  filho mas ele está aprendendo a andar sozinho.

Aviso pra ressuscitar.

Menos de 5%, bem menos... E o que sobra só pode ser o invisível.
Manoel tem o gosto de sangue corrido, sei do gosto que tem a água que escorre da sua testa.
Sonhei três vezes com todos os sinais que ignorei,  quando Sérgio me ligou dizendo aquilo
A central de atendimento comporta centenas de pares de ouvidos, como posso perdurar a coisa incrédula que habita por querer a restauração do que se quebrou?
-Eu queria dizer uma coisa antes de terminar a ligação.
-Pois não.
-As pessoas que estão contigo, estão contigo porque tu é especial, não se preocupa, terás uma passagem linda.
A nunca mencionada com o próprio nome vidrou os olhos na tela de um computador segurando os fios.
-Obrigada.

E me lembro bem do seu semblante de quem apertaria DEL sem usar 1%
Sem nem saber que os sóis vem mostrando outras coisas pois quem sente dor não fica na sala de espera.

Just dream

Estive nas bordas das nuvens
e por ser magnífica a sensação
Tive que sentir por todos os poros
A vida nunca tinha me olhado de volta
Daquela vez olhou
E as minhas esferas de  petróleo reluziram na escuridão.